TOTAL DE VEZES EM QUE ESSE BLOG FOI ACESSADO:

08/02/2012

GUIMARÃES ROSA EM 2012: 45 ANOS DE SEU FALECIMENTO E MAIS 60 ANOS DE SUA VIAGEM AO SERTÃO.

56 Anos de “Grande Sertão: Veredas” e a Copa do Mundo de 2014

Xiko Mendes
(da Academia de Letras do Noroeste de Minas, em Paracatu).

Em 1956 tomava posse como presidente do Brasil o mineiro Juscelino Kubitschek. Em seu Plano de Metas a obra mais importante era a construção de Brasília no meio do sertão do Planalto Central goiano. Essa era uma utopia que constava do nosso projeto ideológico de Nação desde 1821 – há 190 anos – quando o Patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada, nas “Instruções do Governo de São Paulo aos Deputados da Província às Cortes de Lisboa”, mencionou o assunto e sugeriu a localização da nossa nova capital na latitude 15º. Também em 1956 era publicado o romance GRANDE SERTÃO: VEREDAS do escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967). JK e Guimarães Rosa se tornaram menestréis de uma nova epopéia percorrendo caminhos diferentes. A construção de Brasília colocou em definitivo o Brasil na Modernidade. A arquitetura arrojada e a estrutura urbana da Nova Capital são o símbolo do domínio pleno da ciência e da tecnologia a serviço do futuro de nosso país. Com Brasília ganhamos uma rede viária que conectou todas as regiões, reduziu as desigualdades regionais do nosso desenvolvimento e aproximou populações de todos os cantos do Brasil.

Mas enquanto JK colocava o Brasil na Modernidade fazendo o povo adaptar-se aos novos processos nos quais a cultura de massa e a sociedade de consumo se tornam eixos norteadores do nosso tempo, Guimarães Rosa voltou-se à reconstituição onírica e idílica de uma outra temporalidade: aquela do Brasil-Sertão que gradualmente, com a inauguração de Brasília, veio a desaparecer (ou ainda está desaparecendo?). A categoria Sertão, como conceito acadêmico, era a forma com que os moradores do litoral e os colonizadores portugueses se referiam aos moradores do interior do Brasil, distantes da modernidade européia e de seu suposto (e questionável) “padrão civilizatório”. A cultura caipira ou matuta desenvolveu-se no sertão como resultado da fusão de valores culturais aborígines e europeus, fruto da mestiçagem que deu origem ao sentido de nacionalidade brasileira. Antônio Cândido em seu “Parceiros do Rio Bonito”, Euclides da Cunha em “Os Sertões” e Darcy Ribeiro – fundador da Universidade de Brasília – em seu “O Povo Brasileiro”, confirmam a tese de que o sertão e a cultura nele desenvolvida foi o elemento-síntese definidor da formação de nossa nacionalidade. E o rio São Francisco – “o Grande Caminho da Civilização Brasileira”, segundo o historiador sergipano João Ribeiro, foi o “interlocutor” geográfico que moldou entre nós o conceito de nação visto que esse rio tornou-se, no Brasil Colônia e Império, o eixo da integração nacional. O território banhado pelo Velho Chico, o rio dos currais, servia de elo na comunicação interregional entre os centros criadores de gado do Nordeste, os centros mineradores do Centro-oeste, e a Amazônia.

Guimarães Rosa – que antes já publicara o livro Sagarana, em 1946 – realiza uma viagem pelos sertões mineiros da margem direita do rio São Francisco. Nessa viagem, em 1952, recolhe informações suficientes para editar quatro anos depois o romance que é a síntese do Brasil-Sertão, e se constitui como a base na qual se sustenta, por meio de sua linguagem literária, aquela cultura matuta ou caipira de que falamos anteriormente. Grande Sertão: Veredas é um diálogo épico com o Brasil que resultou do encontro entre diferentes temporalidades históricas. Nesse romance, o autor se utiliza da oralidade como instrumento da linguagem para tecer os fios da história do homem sertanejo que naquele ano de 1956 passava a ser alvo das mutações culturais e sociais provocadas pela construção de Brasília. Os personagens roseanos do romance citado percorrem caminhos imaginários do Velho Chico entre o norte-noroeste de Minas, o sul da Bahia e o nordeste goiano, travando combates entre jagunços que sempre se deslocam em fuga para o Vale do Rio Urucuia.

Em 1989 era criado o PARQUE NACIONAL GRANDE SERTÃO VEREDAS que hoje ocupa uma vasta área de 231 mil hectares e está localizado entre as bacias do Carinhanha e do Urucuia, ambos afluentes do São Francisco. Esse parque, que ocupa territórios dos municípios de Formoso, Arinos e Chapada Gaúcha, em Minas Gerais, e de Cocos, na Bahia, é um dos pontos de visitação incluídos no Roteiro de Turismo da Copa do Mundo de 2014. Nessa região do Urucuia ainda é possível vivenciar paisagens, situações e ações do homem do Sertão tal qual descrito por Guimarães Rosa há cinqüenta e cinco anos. Em Chapada Gaúcha é realizado, anualmente e sempre em julho, o ENCONTRO DOS POVOS DO GRANDE SERTÃO VEREDAS. Esses municípios ainda conservam parte significativa das belezas e dos valores culturais presente no romance de Guimarães Rosa.

Nesse momento em que o Brasil prepara-se com infraestrutura para receber os visitantes estrangeiros e nacionais para os jogos da COPA DO MUNDO a realizar-se em nosso país em 2014, faz-se oportuno refletirmos sobre o impacto turístico, cultural e político da obra “Grande Sertão: Veredas” como síntese de um Brasil que modernizou-se, mas também sertanejou-se com a chegada de Brasília no Brasil Central. Comemorar o aniversário de estreia desse romance é também uma forma de construirmos o debate sobre a conservação das manifestações oriundas da cultura popular matuta. Precisamos, nesse momento, debatermos as seguintes questões:

1. Oferecer infraestrutura viária e turística aos municípios do Entorno do Parque Nacional Grande Sertão Veredas como ação emergencial visando a Copa de 2014, viabilizando políticas públicas que desenvolvam as cidades dessa região.

2. Aprovar no Congresso Nacional a criação da Região Integrada de Desenvolvimento Econômico Sustentável da Trijunção entre Bahia, Goiás e Minas Gerais (RIDEBAGOMINAS) como instrumento de planejamento regional que garanta a sustentabilidade social, econômica, cultural, político-institucional e ecoturística dos municípios que ficam no Entorno da unidade de conservação ora mencionada.

3. Aprovar a institucionalização de uma rodovia federal denominada ESTRADA-PARQUE GUIMARÃES ROSA interlingando a BR-O20 com o Norte de Minas por meio de itinerário que percorra o entorno do Parque Nacional Grande Sertão Veredas. (A Fundação Pro-Natureza – Funatura, entidade que administra o Parque, já tem projeto pronto para viabilizar esse debate).

O debate sobre o romance de Guimarães Rosa exige de nós um compromisso sereno com a preservação do BRASIL-SERTÃO como símbolo do nosso reencontro com o passado e as identidades brasílicas que deram origem ao Povo Brasileiro. A elite política e intelectual do nosso país precisa comprometer-se com esse debate, pois em 2014 comemoraremos, junto com a COPA, os 120 anos do Relatório da Missa Cruls, que serviu de base para iniciar os estudos dos quais resultaram Brasília. JK e Guimarães Rosa representam o diálogo épico entre a Modernidade e o Sertão na construção desse debate.

Em 2012 comemoraremos 45 anos da morte de Guimarães Rosa e 60 anos da viagem dele aos sertões barranqueiros do Velho Chico. Que isso sirva de inspiração para que as questões levantadas neste texto se tornem realidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Por favor, assine seus comentários para que possamos respondê-los. Excluiremos todos os comentários ANÔNIMOS.