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05/09/2011

ESTRADA REAL PICADA DA BAHIA PASSAVA EM FORMOSO-MG.

PICADA DA BAHIA – seu próximo Roteiro de Turismo pelo Brasil!

(Palestra proferida em 4 de abril de 2006 no Auditório Nereu Ramos, no Congresso Nacional, durante lançamento do projeto de roteiros eco-turísticos na antiga Estrada Real Picada da Bahia).

Xiko Mendes

As principais jazidas no Brasil foram oficialmente descobertas entre 1694 e os anos 1730. Daí em diante, gente de diferentes lugares saíram à procura do melhor caminho para se chegar ao sertão das minas. Grandes levas de pessoas daqui e d’além mar deslocaram em busca de tesouros. Logo se estabeleceu uma complexa conexão socioeconômica entre as regiões mineradoras (MG, GO e MT) e os centros criadores de gado do São Francisco onde estavam os “donos do mundo”, proprietários de infinitos latifúndios bovinocultores como a Casa da Torre (Garcia d’Ávila) e a Casa da Ponte (Guedes de Brito), além dos Cardoso, donos do Norte-noroeste de Minas.

O elo desta conexão eram as “picadas” – estradas improvisadas à custa de enxadão, foice, facão e machado por garimpeiros, pecuaristas, mascates, gente de todo tipo que se aportava no sertão. Preocupado com o contrabando, o Fisco Português logo dava um jeito de assumir pleno controle oficializando estes caminhos como Estradas Reais, também chamadas de estradas dos currais. Umas delas, que ficou conhecida como Picada da Bahia, foi oficializada por D. João V em 1736. Oficializada, por ela deveriam passar todos os viandantes, inclusive as autoridades da Coroa que periodicamente trafegavam visitando povoados, capitanias e postos fiscais instalados ao longo de seu itinerário.

O renovado historiador Paulo Bertran (21/10/48-1º/10/05) teve o privilégio de redescobrir esta grande rodovia colonial quando achou, inédito(!), o precioso documento “JORNADA QUE FEZ LUÍS DA CUNHA MENEZES da Cidade de Bahia para a Vila de Caxoeira no dia 29 de agosto, e desta no dia 2 de setembro para a Vila Boa, Capital de Goiyaz, aonda chegou no dia 15 de outubro de 1778”. Publicado na íntegra em sua “Notícia Geral da Capitania de Goiás em 1783 – Tomo II” (1997), o documento é um roteiro de viagem do polêmico D.Luiz da C. Menezes, imortalizado como Fanfarrão Minésio nas Cartas Chilenas, do poeta inconfidente Tomás A. Gonzaga. Recém-nomeado para governar a Capitania de Goiás criada em 1749, D. Luiz ordenou ao seu escrivão a elaboração detalhada de sua jornada para o sertão das minas.

Com cerca de 2630 Km de extensão e ligando cidades distantes como Salvador e Cuiabá, a Picada da Bahia passava por dezenas de lugares que hoje são cidades baianas, mineiras, goianas... antes de seguir caminho até a Bolívia. De Cachoeira, importante cidade histórica da Bahia ainda perto de Salvador, a estrada margeava o rio Paraguaçu acima passando por cidades como Mangabeira, Muritiba, Cruz das Almas, Boa Vista do Tupim, entre outras, atravessava a Serra do Sincorá deixando à direita a Chapada Diamantina; chegava ao Rio de Contas – lugar de mineração de onde saía outro caminho para o norte de Minas; aqui tomava o rumo sudoeste passando por Caetité, Palmas de Monte Alto até o porto de Malhada (hoje cidade) na confluência do rio Verde Grande com o São Francisco, divisa BA/MG. Dali as pessoas desciam em canoas até o porto onde hoje está Carinhanha-BA, outra cidade histórica existente desde 1709 e ex-sede de fazenda de Manuel Nunes Viana, vencedor da Guerra dos Emboabas na briga com os paulistas que fugiram e descobriram as minas de GO/MT. Ali na foz do rio Carinhanha a Picada da Bahia bifurcava-se: a primeira opção era seguir o São Francisco acima passando por cidades mineiras antigas como Matias Cardoso, Januária, São Romão, Paracatu... até encontrar-se com a “Picada de Goiás” que rumava para esta Capitania pelo Registro Fiscal de Arrependidos em direção à Luziânia-GO. Ainda neste trajeto tinha gente que parava na foz do rio Urucuia – imortalizado por Guimarães Rosa em “Grande Sertão: Veredas” – seguia este rio acima passando por um porto antigo hoje cidade de Buritis-MG até chegar no Registro Fiscal de Lagoa Feia já em Formosa-GO.

Na segunda opção, o viajante seguia rio Carinhanha acima até Sítio d’Abadia-GO ou até Formoso-MG, ambas no Marco Trijunção (divisa BA/MG/GO) – região onde foi instalado outro posto fiscal – o Registro de Santa Maria – onde está hoje o Parque Nacional Grande Sertão Veredas, e dali passava por Flores-GO, cidade histórica habitada por negros, região do Vão do Paranã onde está a Comunidade dos Kalungas, e prosseguia passando por Santa Rosa, Formosa, Planaltina(DF), Luziânia, Pirenópolis, entre tantas outras até chegar em Vila Boa (hoje Goiás Velho) – ponto final da jornada de D.Luiz da C. Menezes, que usou este segundo itinerário em 1778.
A Picada da Bahia – a Estrada da Integração Nacional – continuou sendo usada até a década de 1940/50 quando por ela passavam os caminhões paus-de-arara que transportavam nordestinos para a Colônia Agrícola Nacional (hoje Ceres-GO), criada por Vargas e depois para a construção de Brasília. Só foi desativada em definitivo em 1959 quando foi construída a BR-020 (Brasília-Fortaleza) deixando dezenas de cidades isoladas do progresso. Em 1804 por ela também passou Caetano Pinto de Miranda Montenegro que foi de Cuiabá-MT a Recife-PE e documentou tudo num relatório ao Visconde de Anadia conforme nos relatou Euclides da Cunha em “Os Sertões”.

Com a morte de Paulo Bertran, o momento é oportuno e seria justo ressuscitar a Picada da Bahia recriando estas conexões histórico-culturais entre cidades por meio de um amplo ROTEIRO DE TURISMO SUSTENTÁVEL. Como ele era um apaixonado pelo Cerrado e pela Natureza, fica aqui nosso apelo aos governos da Bahia, Minas, Goiás e DF para que transformem pelo menos parte desta Estrada em pontos de visitação para turistas.

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